O Rapto das Cebolinhas – Peça Teatral – Maria Clara Machado

O Rapto das Cebolinhas –  Peça Teatral 
–  Maria Clara Machado
Um ato
em três cenas sem intervalo
O Rapto das Cebolinhas -  Peça Teatral  -  Maria Clara Machado
  Imagem meramente ilustrativa
Personagens: Vovó Felícia –       
, Maneco-       , Lúcia-     , Gaspar, o cão-      , Florípedes, a gata-      , Simeão, o burro- ,Camaleão Alface-           , Médico –
Cenário
Único –
O cenário representa a horta da VOVÓ FELÍCIA.  São vistos três pezinhos de planta.  Girassóis. À frente da horta, uma cerca bem
baixinha. Um espantalho. Uma árvore. Um banco na frente da árvore. Uma casa de
cachorro no proscênio à direita.
Primeira
Cena  
Vovó
Felícia – (entra olhando o céu)
Ah que bela noite! Que sono!
(bate o relógio) Nossa já são 3 horas! É hora de dormir! Todos já se
recolheram, agora sou eu (boceja). Boa noite queridas cebolinhas! (fala para o
publico) Estas cebolinhas são preciosas! Quem as possuir é feliz para toda
vida. Elas podem trazer para cada um maravilhosos sentimentos como a CORAGEM
(amarelo), a ALEGRIA (azul), o RESPEITO(verde) e o AMOR (vermelho). (A medida
que fala mostra cada uma das cebolinhas de cor diferente que podem também ter o
nome dos sentimentos escrito). Ah!!! (boceja) Fiquem ai direitinho minhas
cebolinhas!!! Até amanhã (sai)
(É madrugada. Vê-se passar pela cena uma
figura envolta numa capa preta, com um grande chapéu. (Os passos devem ser
acompanhados do barulho de lixa raspando, reco-reco e pente de arame num
tambor.) Olha para todos os lados, penetra pela porteira da cerca, olha de novo
para todos os lados, procura no chão, descobre o que queria, faz o gesto de
arrancar, cobre o que arrancou com a capa e, pulando a cerca, desaparece de
cena, sempre escondendo o rosto. Pausa. Começa a clarear, ouvem-se o galo
cantar e passarinhos. A VOVÓ FELÍCIA entra cantando alegremente, carregando
regador.  Entra na horta, pára e grita.
VOVÓ FELÍCIA:
Roubaram! Socorro! Socorro! Roubaram o pé de cebolinha da VOVÓ FELÍCIA Felício.
Roubaram! (“Pausa”.) Quem terá sido? Quem teve coragem de roubar o pé da mais
preciosa cebolinha que existe no Brasil? Onde está o Gaspar? (“À parte”.)
Gaspar é o vigia da horta. (“Chamando”.) Gaspar! Gaspar!…
“Ouve-se
um latido, e em seguida aparece Gaspar, um enorme cachorrão”.
VOVÓ
FELÍCIA
: Gaspar, quem roubou o meu pé de cebolinha?
GASPAR: (“que não fala, mas late com expressão
humana, dando as inflexões necessárias”)
Uau… uau… (“Corre até os últimos pés de cebolinha e cheira-os ruidosamente”.)
VOVÓ
FELÍCIA
: Foi você quem comeu a minha cebolinha? “Gaspar late que não”.
VOVÓ
FELÍCIA
: Palavra de cachorro? “Gaspar
late que sim”.
VOVÓ
FELÍCIA:
(“à
parte”)
Estou na dúvida se cachorro tem ou não tem palavra. (“Para Gaspar”.) Então quem foi?
GASPAR: (“meio apavorado”) Uau… uau… (“Indica a direita com o focinho”.)
VOVÓ
FELÍCIA
: Foi Florípedes?
GASPAR:
Uau… uau… (“Diz que não”.)
VOVÓ
FELÍCIA
: Foi Simeão?
GASPAR: Au…
au… (“Diz que não”.)
VOVÓ
FELÍCIA
: Gaspar, vá correndo chamar Florípedes e Simeão. Quero todo
mundo aqui.
“Sai
Gaspar”.
VOVÓ
FELÍCIA
: Ah! Preciso descobrir o ladrão. Quem teria a coragem de
fazer uma coisa destas? (“Chamando”.) Lúcia, Maneco! Onde estão os meus netos?
Maneco, anda cá, seu maroto. Lúcia, acorda, menina. O avô foi roubado!
“Entram
Lúcia e Maneco, aflitos”.
MANECO: Você
chamou, vovó?
LÚCIA: O que é
que aconteceu, você está tão nervosa!
VOVÓ
FELÍCIA
: Vocês não podem imaginar o que aconteceu? Olhem lá dentro. (“Aponta para dentro da cerca. Os dois
meninos entram no cercado”.)
MANECO: Oh!
LÚCIA: Que
horror! Pobre vovó! (“Para a platéia”.) Arrancaram o pé de cebolinha. (“Para a
vovo.) Quem foi?
MANECO: Quem
foi o ladrão, hem, vovo?
VOVÓ
FELÍCIA:
Não sei ainda. Temos que descobrir. Ainda ficaram 3 pés. Os
últimos. (“Chorando”.) Ai, meu Deus! Estou tão triste que nem posso pensar
direito. Dois anos criando essas cebolinhas, e agora…
LÚCIA: Fique
mais calmo, vovó. Não se amole tanto. Mandaremos vir outras mudas iguais e elas
vão crescer que nem capim.
VOVÓ
FELÍCIA
: (“indignada”) Lúcia, minha neta, não torne a dizer esse
absurdo. Você sabe muito bem que estas cebolinhas são diferentes. Quem toma chá
dessas cebolinhas tem coragem, respeito, alegria e amor! E estas são as últimas
que existem no Brasil…
MANECO:
(“interrompendo”) Fale mais baixo, vovó. Você quer que outros ladrões apareçam
para roubar as 3 que sobraram?
VOVÓ
FELÍCIA
: É mesmo, meu filho. Todo o cuidado agora é pouco. Irei até
a cidade contratar um detetive para descobrir o ladrão. Prestem bem atenção no
pessoal daqui. Todo mundo é suspeito. Vou me vestir e já volto. (“Sai”.)
MANECO: Pobre
vovó. Quem teria sido o ladrão?
“Ouve-se
um miado, um relincho e um latido, e em seguida entram os bichos”.
MANECO: Aí
vêm os bichos. Florípedes, venha cá.
“Ela se
aproxima de Maneco, dengosa”.
MANECO: Foi
você quem roubou as cebolinhas do vovó?
“Florípedes,
assustada, vai até o canteiro, olha, mia, volta para junto de Simeão e, miando
com convicção, faz que não, ofendida, como dizendo: “Isso é pergunta que
se faça”?”.
MANECO:
Simeão, venha cá.
“Simeão
se aproxima com medo”.
MANECO: Foi
você quem roubou as cebolinhas do vovó?
SIMEÃO:
(“com receio”)
Hiiiiii. (“Faz
que não”.)
MANECO: Mas
vocês dormem aqui fora. Devem ter visto alguma coisa durante a noite.
“A
gatinha e o burro dão miados e relinchos significativos de que viram alguma
coisa, sim”.
MANECO: Então
viram o ladrão? (“Miam e relincham que
sim”.)
Como era ele? (“Os dois se
olham um pouco, e depois passam pela cena imitando o andar do ladrão”.)
Que
andar mais esquisito. E você, Gaspar, não viu nada? Não vigiou a horta durante
a noite, como era o seu dever? (“Gaspar
abaixa a cabeça”.)
LÚCIA:
Vamos, Gaspar, explique-se. É para o seu próprio bem. Onde é que você passou a
noite?
“Gaspar
indica que passou a noite na sua casinha. Entra na casa”.
MANECO: E não
viu nada? Ninguém entrar?
GASPAR:
Uau… uau… uau… (“Faz que não, e
mostra que estava dormindo”.)
MANECO: Como
assim? Dormindo! É assim que você toma conta da horta? É assim que você é amigo
do vovó? (“Para a platéia”.)
“Gaspar,
aflitíssimo, dá latidos de tristeza”.
LÚCIA:
(“indignada
”) Não ofende o Gaspar, Maneco; quem sabe não
deram remédio para ele dormir?
“Gaspar,
ao ouvir isso, anima-se e dá saltos significando que sim”.
MANECO: (“intrigado”) Será
possível? Então o caso está se tornando mais grave. Muito mais grave.
LÚCIA: (“ao ouvido de Maneco”) Florípedes e
Simeão viram tudo.
MANECO: (“dirigindo-se para os dois”)
Florípedes e Simeão, respondam: o ladrão era alto ou baixo? (“Os dois olham-se
espantados, pensam um pouco; e depois, ao mesmo tempo, Florípedes sobe no banco
e faz um gesto, indicando que o ladrão era muito alto, miando prolongado, e
Simeão se abaixa relinchando, indicando que o ladrão era muito baixo”.) Que
negócio é este? Cada um viu diferente? (“Os
dois se olham, percebem a contradição e desmancham rapidamente o gesto.
Florípedes desce do banco”.)
LÚCIA: Era
gordo ou magro?
“Novamente os dois ao mesmo tempo indicam,
Florípedes que era muito gordo e Simeão que era muito magro; hesitam um pouco e
se olham com medo, percebem o erro e, muito sem graça, desmancham o gesto”.
MANECO: Vocês
estavam era sonhando. Ora essa, vocês não servem para nada. Vão-se embora.
“Florípedes
dá miados aflitos procurando chamar a atenção dos meninos para lhes dizer
algo”.
LÚCIA: (“notando Florípedes”) Espera, parece
que Florípedes quer dizer alguma coisa.
“Florípedes
diz que sim”.
MANECO:
Vamos, Flor, explique-se.
“Junto
com Lúcia, corre para a gatinha. Os dois meninos a animam exageradamente.
Florípedes, vendo-se dona da situação, afasta-se e começa a mímica. Imita o
andar do ladrão e depois finge que desmaia, dando miadinhos finos”.
LÚCIA: Você
desmaiou quando viu o ladrão? (“Florípedes
diz que sim, e Simeão mostra ao mesmo tempo que correu para socorrê-la”.)

Ah, e você correu para socorrê-la quando ela desmaiou? (“Simeão faz que sim, levanta Florípedes e os dois saem correndo”.)
MANECO: E…
depois foram embora correndo?
“Simeão
faz que não, volta sozinho ao meio do palco, tenta mostrar por mímica que quem
saiu correndo foi o ladrão”.
LÚCIA:
Ah!… e o ladrão fugiu?
“Os
dois respondem que sim”.
MANECO: (“ao ouvido de Lúcia”) Ih!… Estou
muito desconfiado. (“Para Florípedes e
Simeão.)
Podem ir agora. (“Florípedes
e Simeão saem”.)
Mas tratem de abrir bem os olhos e os ouvidos. (“Gaspar sai. Maneco grita na direção em que
os bichos saíram”.)
Todo mundo aqui é suspeito!  E essa história que os dois contaram não
combinava nada. É bom espiar bem esses bichos. Eles são muito sabidos.
VOZ DE
FORA
:
Ó de casa!
MANECO: (“para a platéia”) É o vizinho novo, seu
Camaleão Alface.
“Entra
Camaleão Alface, de culote, chapéu de explorador e grandes bigodes. Leva nas
costas uma mochila de onde tirará os objetos necessários para a ação.
CAMALEÃO: (“ainda de fora”) Onde
está a VOVÓ FELÍCIA? (“Vai entrando muito
aflito”.)
Onde está a VOVÓ FELÍCIA? Preciso falar com a VOVÓ FELÍCIA.
LÚCIA: Vovó
está se vestindo, seu Camaleão Alface. Ele vai à cidade para…
CAMALEÃO: O que
aconteceu?
MANECO:
Roubaram um dos pés de cebolinha.
CAMALEÃO:
(“correndo para o local do
roubo”)
Não é possível! Como foi isso?
MANECO: Não
sabemos ainda de nada. Vovó vai à cidade contratar um detetive.
CAMALEÃO:
Detetive?
VOVÓ
FELÍCIA
: (“aparece pronto para
sair e emenda a fala com a do Camaleão.)
… um detetive para descobrir
o raio do ladrão que levou minha cebolinha. (“Pega
a mão do Camaleão e começa a sacudi-la vigorosamente enquanto fala”.)
Como
vai o senhor? Como vai a Associação Protetora das Plantas?
“Camaleão
tenta falar mas não consegue”.
VOVÓ
FELÍCIA
: O senhor continua o presidente? Farei uma comunicação do
roubo na próxima reunião. Agora vou à cidade contratar um detetive. (“Sai andando”.)
CAMALEÃO: Um
detetive? (“Corre atrás do VOVÓ FELÍCIA e
o detém”.)
Um detetive para quê, minha amiga? (“Com ar de grande superioridade”.) Então não sabe que eu sou
formado detetive?
VOVÓ
FELÍCIA
: O senhor?
CAMALEÃO: (“andando lentamente no palco e muito
convencido”)
Passei três anos numa universidade dos Estados
Unidos. (“Parado, para a platéia, e com
malícia”.)
Sou especialista em raptos de verduras, brotinhos, coisinhas
tenras e desprotegidas.
MANECO: Mas o
senhor tem diploma, seu Camaleão?
CAMALEÃO: Aqui
está.
“Puxa
ostensivamente da mochila um enorme diploma. Maneco e Lúcia começam a abri-lo.
É tão grande o diploma que Maneco precisa trepar no banco e Lúcia se ajoelhar
no chão para abri-lo completamente. A VOVÓ FELÍCIA passa os olhos, encantado,
pelo documento e o lê em inglês ruim. Enquanto isso, Camaleão, se transforma
num detetive tirando da mochila capa com estrela, gravata borboleta e uma
enorme lente”.
VOVÓ
FELÍCIA
: Seu diploma é enorme, seu Camaleão Alface. (“Vai para junto dele”.) O senhor está
nomeado meu detetive. Pagarei o que quiser.
CAMALEÃO: Não
cobrarei nada do senhor (“Adulador”.)
Só quero a sua amizade. (“Empunha a lente
e vai para o canteiro”.)
Vejamos primeiro as pistas. (“Consigo mesmo, examinando o local”.) Comecemos pelo… começo.
Vamos agir. Todos são suspeitos. (“Examina
o avó e, logo depois, as duas crianças, que levam grande susto”.)
Todos,
ouviram? (“Passeia pelo palco examinando
tudo com a lente, e acaba observando a ponta de sua própria bota. Vai subindo
com a lente e, quando percebe o que está fazendo, diz”:)
Quase todos! (“Para a VOVÓ FELÍCIA”.) Vamos, tenho um
plano. (“Para os meninos”.) Que
ninguém saia de casa esta noite. Ordem do detetive Camaleão Alface. (“Quase desaparecendo”.) Ninguém!
“Os
meninos examinam o diploma. Camaleão torna a aparecer e tira o diploma dos
meninos”.
CAMALEÃO: Com
licença, meninos. (“Para a platéia”.)
É o diploma que faz o detetive. (“Sai,
solene”.)
“Lúcia
e Maneco saem atrás, Maneco irritado, Lúcia com grande admiração. Voltam logo
depois”.
MANECO: Não
gostei nada dele. Achei tudo muito esquisito. Você acha que um detetive anda
sempre de diploma, medalha? Ele estava com cara de quem já sabia de tudo. Mas
também tenho um plano. Ainda ficaram 3 pés de cebolinhas. O ladrão na certa
voltará para roubar o resto.
LÚCIA: Ué,
por que é que ele há de voltar, ora!
MANECO: (“categoricamente”) Um ladrão volta
sempre ao local do crime, Lúcia. (“Baixo”.)
LÚCIA: É
mesmo, Maneco. (“Espantada”.) Então
ele é capaz de voltar esta noite. O que é que vamos fazer? Quantos suspeitos
você já tem?
MANECO: (“pensativo”)
Florípedes e Simeão podem ser os ladrões. Gaspar também. Seu Camaleão Alface
também pode ser o ladrão. Todo mundo pode ser o ladrão.
LÚCIA: Ah,
isso é que não! Não consigo ver o Gaspar roubando cebolinhas. Tão bom que ele
é… Nem Florípedes, nem Simeão, nem seu Camaleão Alface… (“Para a platéia”.) Afinal, ele é um
grande detetive!
MANECO: (“implicando”) Você é muito boazinha,
Lúcia. Por isso não serve para detetive. Um detetive tem que ser que nem eu:
durão!.
LÚCIA: Ah
seu bobo! Como é que você pode desconfiar dos pobres bichinhos da vovó (dá-lhe
uma corrida e Maneco sai e Lúcia se esconde ao ouvir barulhos, entra Gaspar. Fareja todos os lados,
dirige-se para o canteiro, cheira as cebolinhas com grande cuidado e
sai. Lúcia observam-no escondidos”.
LÚCIA: Oh!!!
(Entra
Florípedes puxando Simeão pela mão. Sobe no banco e com pequenos miados e
grandes gestos procura convencer Simeão, falando-lhe ao ouvido. Simeão não
parece concordar. Por fim, fica irritado e sai para o meio do palco, mostrando
claramente que não concorda. Florípedes não desiste e vai atrás dele, puxando-o
pelo rabo até o canteiro. Argumenta novamente. Simeão vira-lhe as costas
mostrando de novo que não concorda. Florípedes tenta mais uma vez convencê-lo,
usando de seus encantos felinos. Mas nada demove Simeão de sua decisão. Afinal,
Florípedes, irritada, desiste, e resolve executar seu projeto sozinha. Simeão,
apavorado de perdê-la, sai correndo atrás dela”.
LÚCIA: (“que assistiu a toda a cena escondida)
Oh, oh!… (“Sai correndo, chamando”.)
Maneco… Maneco… Maneco…
Segunda
Cena
Escurece bastante. É noite. Entra Maneco
envolvido por uma grande capa preta, até o chão, e por um grande chapéu preto.
Pé ante pé (exageradamente), com grandes flexões de joelho, olhando para todos
os lados, pára um momento diante da cebolinha e, fazendo que ouve um barulho
(barulho do camaleão), corre e se esconde atrás do espantalho. Logo depois
entra Camaleão Alface, vestido da mesma maneira, andando identicamente. Vai até
a cebolinha, pára um instante, atravessa a cena e ouvindo barulho dos bichos esconde-se
no lugar de onde saiu. Em seguida, entram Florípedes e Simeão, ela na frente,
vestidos também como os outros. Andando sempre como Maneco e Camaleão Alface,
dirigem-se os dois para a cebolinha, param um instante e encaminham-se para
trás da árvore, onde se escondem. Torna a voltar Camaleão, vai novamente até a
cebolinha, arranca uma disfarçadamente e continua a volta pelo palco. Ao passar
pelo espantalho é seguido, sem o saber, por Maneco; este, por Florípedes e
Simeão. Os quatro dão uma volta por todo o palco no mesmo ritmo. A certa altura
ouve-se o coaxar de um sapo. Param todos ao mesmo tempo (estão em fila indiana)
e olham cada um por sua vez para trás. Recomeçam a andar e depois de uns
instantes ouvem novamente o sapo.Param juntos. Camaleão volta-se e dá com os
outros. Grande confusão e correria, gritos, miados, relinchos.Todo o andar dos
personagens deve ser seguido do barulho de lixa, reco-reco, tambor etc.
MANECO: Peguei
o ladrão!
CAMALEÃO: Me
larga, menino, sou Camaleão, o detetive, e o ladrão é você.
“Mais gritos, miados e relinchos até que
entra a VOVÓ FELÍCIA, de ceroulas, segurando um lampião e dando a mão a Lúcia.
A cena se ilumina e VOVÓ FELÍCIA vê o detetive agarrado em Maneco. Florípedes e
Simeão, morrendo de medo, observam num canto”.
VOVÓ
FELÍCIA
: (“entra gritando”) Que barulho medonho é este? Parem de
gritar. (“Vendo a cena”.) Meu Deus, quantos ladrões! (“Ilumina cada ladrão com
o lampião.Lembra-se das cebolinhas e corre para o canteiro.) Roubaram o meu
segundo pé de cebolinha!! (“Senta-se desolada no banco”.)
CAMALEÃO:
(“tirando o disfarce”) Pode ficar certa, VOVÓ FELÍCIA, que o ladrão está por
aqui. Pus este disfarce para ver se confundia o larápio, e o senhor há de
perceber que aqui há dente-de-coelho.
MANECO:
(“também tirando o disfarce”) Também pus o disfarce para o ladrão se confundir,
vovó.
VOVÓ
FELÍCIA
: (“irônico, levanta-se e dirige-se aos bichos”) É, e vocês
dois aí no canto, também puseram o disfarce para ver se pegavam o ladrão mais
facilmente, não é?
“Florípedes e Simeão, aterrorizados,
meneiam a cabeça dizendo que sim”.
VOVÓ
FELÍCIA
: (“senta-se novamente e diz, lamuriosa”) É assim que me
ajudam? O que vocês estão fazendo é ajudar o ladrão. Com isso ele roubou minha
segunda cebolinha.
CAMALEÃO: (“indo
para o meio do palco e tomando conta da situação”) Todos os presentes são
suspeitos. Desobedeceram à minha ordem de não sair à noite.. Vamos, quero vocês
aí enfileirados para uma inspeção. (“Todo amável com o VOVÓ FELÍCIA”.) A
cebolinha raptada não deve estar muito longe.
“Maneco recusa-se a obedecer.  Lúcia empurra  Maneco para o lugar e este fica emburrado”.
CAMALEÃO: Abram
a boca e Mostrem as mãos. (“Ele examina.Puxa VOVÓ FELÍCIA para o centro do
palco e diz-lhe confidencialmente:”) Talvez o suspeito tenha engolido a
cebolinha na hora da confusão, e o cheiro deixado na boca será uma pista
preciosa. (“Volta aos bichos e cheira a boca de Simeão e Florípedes. Torna a
cheirar Florípedes, Florípedes mia de medo. Ouvem-se latidos sofredores cada
vez mais fortes”.)