Minha experiência com EJA
Lecionei durante alguns anos a alunos na faixa etária dos 15 aos 75 anos, pessoas pobres de uma comunidade sem água ou energia elétrica.
Saia todas as tardes afim de conseguir uma carona até um ponto deserto da estrada e de lá caminhar cerca de 2 km para dar aula a noite por um salário de R$ 180,00 do qual R$ 63 eram gastos com passagem de volta em ônibus de empresa as 10 da noite.
Muitos diziam ser perigoso (e era) , outros que o salário não valia a pena, mas eu ia dia após dia muito contente, pois não me interessava se faltava material, se não tínhamos livro, se o aprendizado dos alunos do EJA se dá de forma mais lenta, o que realmente interessava era o prazer que proporcionava a cada um deles com minha presença chegando mais cedo sentando-me em seus banquinhos esculpidos artesanalmente, comendo a farinha que eles mesmos produziam ou tomando seu cafezinho e ouvindo suas histórias.
Guardo deles recordações maravilhosas e eles de mim.
Recentemente formou-se um de meus alunos que admiro muito por conta de sua força de vontade. O que aquele menino enfrentou pra conseguir fazer um ginásio poucos suportariam … Louvo á Deus por ter lhe dado forças. Hoje ele está em Manaus e que seja abençoado por lá.
Vou contar-lhes um das inúmeras experiência que tive com eles certa feita
Matemática sempre foi meu calcanhar de Aquiles!
Sempre a detestei com todas as minhas forças,talvez por falta de incentivo, talvez por que minha professora do primário também tivesse certa deficiência, talvez porque eu amasse demais as letras e de menos os números. Certo é que só aprendi a fazer subtração no segundo ano do curso de magistério enquanto observava uma sala de aula.
Uffa … em fim aprendi algo!
Mais tarde lecionava uma sala de jovens e adultos do( EJA )quando um aluno me fez o desafio:
– Professora, a senhora pode ensinar agente a cubar terra?
Bem … essa era a necessidade dos alunos da comunidade e eles estavam ali justamente pra isso, se eu falasse que não sabia fazer perderia com certeza maioria dos alunos ( agricultores preocupados em medir suas terras).
No outro dia pela manhã pedi a meu vizinho (ANALFABETO) que me ensinasse a cubar terra (eu ANALFABETA funcional aff) e ele prontamente me ensinou como nenhum professor faria melhor e aqui aprendi mais uma lição.
– É de onde menos se espera que podemos extrair as lições necessárias para nosso desenvolvimento diário!
E pude mais uma vez valorizar o ser humano que letrado ou não sempre tem algo a compartilhar
Na aula seguinte eu estava ensinando meus alunos a fazer a bendita cubagem da terra e eles em simplicidade de interioranos olhando com admiração a professora que sabia cubar uma terra.(rs)
Aproveitei então todo o entusiasmo para lhes falar que o assunto me foi ensinado não por um professor ou doutor como eles chamam, mas por um analfabeto como eles que aprendeu com a necessidade diária e que cada um inserido em nosso meio e participante de nosso convívio escolar tinha algo a oferecer.
Começou então uma discussão gostosa como as que eu adoro, pois alguns questionavam dizendo:
– Eu não sei fazer um ” O” com um copo.
– Mas sabe fazer farinha e eu não, outros sabem costurar, e eu não, outros sabem acender um fogo a lenha e eu não.
Essa noite a luz do lampião todos tentavam me ensinar como acender um fogão a lenha e como fazer farinha.
Todos ali sentiam-se professores e compreendiam por fim que tinham algo a compartilhar.
Você professor do EJA não deixe de trabalhar a autoestima do seu aluno, pois é essa a chave para o sucesso na Educação de Jovens e Alunos.
Ensinar Aprendendo
Gi Barbosa